Cartaz do Gran Circo anunciava sua chegada na cidade de Niterói. |
O dia 17 de dezembro de 1961 era um dia muito quente. A temperatura rondava os 40 graus. Eu curtia o domingo assistindo uma partida de futebol no campo do Fonseca Atlético Clube, quando fui alertado por uma emissora de rádio, que o Grand Circus Norte Americano instalado na Praça do Expedicionário, em Niterói - onde hoje funciona um Centro Médico do Exército - estava pegando fogo. Ele, que havia sido inaugurado dois dias antes (15/12/1961).
Grand Circus Norte Americano instalado na Praça do Expedicionário, em Niterói (Foto: Labhoi / UFF) |
O incêndio começou no momento em que os trapezistas iriam iniciar o perigoso salto triplo. Ao grito de "incêndio", todos começaram a correr em diversas direções. Ainda cheguei a tempo de ver as labaredas, a fumaça, a correria e o desespero das pessoas, a maior parte com queimaduras, que saiam aos gritos, por um buraco aberto por um elefante (Semba), que salvou muita gente, mas que também matou, pisoteando-as. Também vi corpos e mais corpos estendidos no interior do circo e, até mesmo sentados nas cadeiras. Todos que haviam ido se divertir com os palhaços, os trapezistas e os animais, na base da pipoca e do sorvete.
Foi iniciado o rescaldo pelo Corpo de Bombeiros, e o atendimento aos sobreviventes que eram conduzidos aos Hospitais Antônio Pedro, Santa Cruz, Azevedo Lima, Maritimos e para a Santa Casa de Misericórdia, enquanto os corpos dos que morreram eram levados em caminhões para o Ginásio Caio Martins e para o IML a fim de serem reconhecidos e depois sepultados. Muitos foram colocados nos frigoríficos da Indústria Maveroy (que produzia a geladeira Kelvinator), para serem conservados até o sepultamento.
Voluntários, no Estádio Caio Martins, construindo caixões para as Vitimas fatais. Niterói-RJ Fonte: CPDoc JB |
Ás lágrimas escorria por todos os rostos. Os cirurgiões plásticos Ivo Pitangui e Carlos Caldas, diversos médicos, enfermeiros e voluntários desdobravam-se nos atendimentos. Fui voluntário durante 15 dias no Azevedo Lima, cujo diretor era o saudoso médico Carlos Guida Risso.
A solidariedade do nosso povo e até mesmo internacional, foi enorme. A todo instante chegavam medicamentos, ataduras, alimentos, água. As pessoas corriam de um lado para o outro tentando ajudar de alguma forma. Decorridos tantos anos, ainda não se chegou ao número exato dos que perderam as suas vidas. Dizem que "na maior tragédia em circuito fechado" o número estimado de mortos oscila entre 350 e 400, dos quais 70% eram crianças.
Os culpados foram descobertos: Adilson Marcelino Alves, o Dequinha - condenado a 16 anos e mais seis em manicômio judiciário, que terminou assassinado mais tarde quando fugiu da cadeia - o mentor do crime, porque havia sido despedido do circo; José dos Santos, o Pardal -16 anos e mais um ano em colônia agrícola - e Walter Rosa dos Santos, o Bigode -14 anos e mais um ano em colônia agrícola -. Bigode comprou a gasolina e a jogou sob a lona e Dequinha ateou fogo.
Em São Gonçalo, o então prefeito Geremias de Mattos Fontes desapropriou parte das terras de propriedade do Palacete do Mimi, no bairro Estrela do Norte, e mandou construir o Cemitério de São Miguel, onde foram sepultadas vitimas do incêndio.Uma tragédia que nunca será esquecida!
Durante muitos anos o trauma impediu que crianças e adultos assistissem qualquer espetáculo circense em Niterói e em São Gonçalo. Decorridos 49 anos, minha memória ainda está bem nítida em relação à tragédia. Ainda recordo do corpo de uma criancinha, de aproximadamente, dois ou três anos de idade, que morreu pisoteado por um elefante.
N.R. Recentemente, o Departamento de História da UERJ - Patronato - editou um documentário sobre o assunto e fui um dos entrevistados, bem como os médicos Ivo Pitangui, Carlos Caldas, e, os jornalistas Carlos Ruas e Mário Dias.
Sobre o Autor:
Assueres Barbosa é editor do Blog do Jornalista Assueres Barbosa, um jornalista veterano, carioca da gema (do Méier), especializado em política. Mestre de Cerimônias e Sub-Diretor do Cerimonial da prefeitura de São Gonçalo, adesguiano, flamenguista, extrovertido, simpático, amante das boas coisas da vida, que gosta de dançar (bailes com orquestras (Tabajara), e conjuntos musicais (Pingos & Gotas)), da noite, de Búzios e Angra dos Reis, viajar, ler, bater papo, um amigo fiel, em que pesem falsidades,fazer o bem sem olhar a quem, de viver a vida e de amar de todas as formas possíveis e imagináveis, lembrando as fortes Raízes e os Troncos das Palmeiras. Facebook: Assueres Barbosa. |
Ótimo texto Assuetes. Cresci ouvindo esta estória e me dói no peito mesmo nao nascendo 12 anos depois. Meus pais nao foram por motivos futeis como um desentendimento e desencontro com irmãos. Vale ressaltar que a foto onde se lê " vitimas do circo" deve- se ler voluntários no Caio Martins construindo Urnas para as Vitimas fatais. Sandro Marraschi
ResponderExcluirObrigado, Sandro. Retificado!
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